segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Dias, como este...

Há dias, como este, em que não rejeitamos a companhia de Elias no Horebe. Em que estamos com David em Ziclague, ou com Moisés no Sinai. Em que sentimos, como Paulo, escamas nos olhos do nosso entendimento, em que não palpamos o rumo para a viagem. Há um tronco que não nos amarra, antes nos afaga as dores. Há dias, como este, em que não lhe entendemos a alegria, ou reparamos mais nas sombras e menos na luz . Há dias, como este, em que as palavras não são nossas amigas e os corvos do profeta, ao invés de pães, nos entregam silhuetas negras. Dias em que sombras de aboboreira não nos aconchegam. Dias, como este, em que o mar é nosso inimigo; espreitamos, por detrás de Josafá, por cima do seu ombro, os contornos da Síria e dos seus valentes. Dias, como este, em que não há força, plano ou projecto. Dias, como este, que nos parece mil anos.
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Há dias, como este, em que os desertos parecem pequenos demais e o tempo corre furioso a roubar-nos a solidão. Dias, como este, em que a poesia não nos anima nem nos interpreta o coração.
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Em dias, como este, somos José vendido a Potifar. E a pátria tão longe !
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Em dias, como este, somos barro ainda em lameiro. Não na roda do Oleiro.
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Em dias, como este, somos pedintes siro-fenícios a regatear migalhas no pó. Ouvimos o silêncio dizer que é demais o que aspirámos. Pesamos, sem aferimento, a corrida louca, na contra-mão em que nos projectaram, e onde buscamos, no cinza-baço dos sinais, direcções ocultas. Somos alegoria da caverna.
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Em dias assim, como este, somos pequenos demais. Só Cristo mede a nossa dimensão.
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Em dias, como este, não queremos favos de mel. Justiça e Misericórdia serão repouso e refeição. Ouvir Deus, sentir Deus, bálsamo precioso e único que nos embala o momento.
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Que em dias, como este, o céu se cubra de Glória e não de chumbo.
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Jacinto Lourenço