"1. Simplificando muito, o capitalismo, na sua expressão pura e dura, era a única salvação, sobretudo depois da queda do muro de Berlim. Agora , já não são , apenas, os anti-capitalistas do costume a verem nele o caminho da perdição. Quem esperava ter o paraíso garantido para sempre, sentiu-se atirado para as trevas exteriores, onde só há choro e ranger de dentes, a morte de toda a esperança. Para quem acredita que fora do capitalismo não há salvação, a tarefa mais importante consiste em restituir a fé e esperança nesse sistema para salvar a economia de mercado. A fórmula pronta a servir, diante do fracasso da sua auto-regulação, é a ética aplicada. Como a ética não é um produto natural - para não deixar tudo à arbitrariedade subjectiva -, são precisas leis que regulem a vida numa sociedade democrática. Como as leis precisam de ser aplicadas, é necessária a supervisão para saber se estão a ser bem aplicadas ou não. Como numa sociedade laica não se confia a Deus a supervisão, é preciso ter fé nos seres humanos e no funcionamento das suas instituições. Como estes e estas são falíveis, é preciso o recurso à polícia, aos tribunais e às cadeias. Como a justiça não tem fórmulas automáticas de funcionamento, também é preciso fé na justiça, fé no estado. Diz-se que, quando nada disto funcionar, ainda resta o desespero e a violência.
2. Depois de oito anos a acreditar nas trapaças de George Bush e da sua pandilha, assim como nos negócios vergonhosos de Wall Street, procura-se fazer de Barack Obama o salvador da superpotência para que ela seja a salvação do mundo. É normal que cada grupo procure atrair o Presidente para o seu campo. Foram, sem dúvida, os menos poderosos que o elegeram. Serão, no entanto, os mais poderosos que, em nome das virtualidades da economia de mercado e do seu dinamismo, desviarão a atenção de Obama dos mais pobres das Américas, da África e da Palestina(...)."
Frei Bento Domingues
In jornal Público 04, Janeiro, 2009