Um painel, no centro da vila, representando o último canto da 'Eneida' de Virgílio, vai ser desvendado amanhã, no dia do município de Alter do Chão.
Alter do Chão vai fazer amanhã a divulgação oficial do último espólio arqueológico romano descoberto mesmo no centro da localidade, cujos documentos mais significativos são os monumentais mosaicos encontrados em razoável estado de conservação. Com características únicas, representa o último canto da obra de Virgílio, a Eneida, e a sua datação aponta para o século IV d.C.
As intervenções arqueológicas realizadas nos últimos anos, cujos vestígios mais salientes agora se tornaram públicos, permitiram identificar um conjunto digno de nota de estruturas com características romanas que teriam sido, muito provavelmente, um conjunto habitacional bastante ampliado. O arqueólogo Jorge António, há vários anos a trabalhar no local, assinala que esse conjunto habitacional se poderá enquadrar entre os séculos II e IV d.C.
Além dos mosaicos, foram descobertos objectos numismáticos, esculturas, cerâmica, quer doméstica (como por exemplo grandes recipientes destinados a conservação e transporte de alimentos) quer de construção, como telhas de vários modelos.
Conforme referiu o arqueólogo, o processo de pesquisa arqueológica irá continuar, até porque os indícios já detectados apontam para uma maior extensão de um conjunto ainda submerso que pode ser desbravado.
Foi durante trabalhos de obras públicas nos anos 50 do século XX, que os vestígios começaram a ser descobertos, o que levou, em 1956, a uma intervenção de escavação, onde foi encontrado o primitivo balneário, as canalizações e mesmo os primeiros mosaicos com motivos geométricos. Era normal e vulgar, os habitantes locais encontrarem, há 20, 30 anos, "moedas antigas" quando andavam a pastar o seu próprio gado no local.
Entretanto têm sido escavados noutros locais do centro de Alter do Chão vestígios de períodos antigos, como uma necrópole tardo-antiga, cujos trabalhos não estão terminados. Vestígios localizados numa zona desabitada e em ruínas, mas que tem uma certa importância histórica, pois nela foram encontrados materiais que vão dos tempos romanos dos meados do século I DC até enterramentos que teriam sido consumados nos séculos VII-IX, ou seja quando aquele território já estaria sob ocupação árabe.
Um dos espólios descobertos diz respeito a uma placa funerária, cujo epitáfio se refere a uma senhora de nome Sentia Laurila, que viveu no século I d.C. e que foi encontrada à cabeceira de uma sepultura, cuja datação, por radiocarbono, de um dos ossos enterrados, o situa nos finais do século VIII, princípios do IX. Esta necrópole era cristã, mas a região, nessa altura, já estava sob a alçada moura, possivelmente com uma ocupação muito lassa, do ponto de vista administrativo.
De acordo com o estudo do epitáfio em que participaram o arqueólogo Jorge António e o catedrático José d`Encarnação, verifica-se que a mulher terá morridos aos 85 anos. Na placa, são identificados os seus herdeiros. Aqueles investigadores admitem que o nome Laurila tem ascendência indígena.
Por Serafim Lobato
In Diário de Notícias de 20 de Maio de 2009