segunda-feira, 27 de julho de 2009

Nobreza no Olhar

“Para um nobre coração os mais ricos presentes tornam-se pobres, quando aquele que oferece o presente já não mais demonstra afecto.”

William Shakespeare

Alguém, dentre todos, viu em mim alguma nobreza. Uma lisonja capaz de levar-me muito próximo ao desconforto. Percebo agora, é muito mais leve o peso da fama de um adorável trapalhão esculachado e rude em relação ao peso da fama de nobre. Há dor tremenda na oferta de um desprezador. O desprezo é o oposto do afecto. Não sei bem como, mas cheguei a esta etapa da vida e ela me deu novas directrizes. Meu actual script, paradoxalmente, é menos falante e mais observador. Meu papel actual inclui escutar e ler, em detrimento do falar. Até o escrever me angustia. Recebi a incumbência de ser mais conciliador e cordato. Duro é começar a ver mais, mesmo vendo menos, consequência da diminuição de palavras vertidas. Ao passar por uma rua pela primeira vez, não sabia o que eram aquelas portas e, tão pouco, conhecia o destino das transversais e vielas. Hoje, quando passo pelas mesmas ruas, surpreendo-me com a experiência, pois ela responde-me a essas perguntas, antes sem respostas. Sei agora quando escutar ou não e, sobretudo, quando lembrar ou não. Descobri o quão belo é esquecer um pecado ou uma afronta recebida, tempos atrás. Estou abraçando mais e melhor as pessoas. Meu aperto de mão se não tem o mesmo vigor, ganhou em sinceridade. Meus olhares são mais respeitosos e sensíveis. Ainda me irrito no retalho, mas estou bem mais longânimo no atacado. Talvez fique mais perto da perfeição quando galgar um grau acima. Por enquanto, não estou apto a receber o presente de quem não me tem nenhum afecto. Não que isso possa acontecer facilmente, se a vida me pregar uma peça dessas ou, de novo, vier uma traição qualquer, com a chegada de algo assim às minhas mãos, devolverei ao traidor ou desafecto. Então, olhando firme em meus olhos, pelo espelho, perguntarei a mim mesmo: Serei eu um nobre?
In Caverna do Lou