Depois de mais de 3 décadas, muito esforço, dedicação, envolvimento, alegrias e sofrimentos, deixei de lado a 'igreja formal'. É possível, apesar de pouco provável, que alguns dos leitores desse blog sejam membros da mesma igreja da qual eu participava. A esses, se existirem, um abraço apertado. Não nos veremos mais nos domingos nem nos demais encontros promovidos pela instituição (salvo, talvez, como visitante em alguma situação), mas espero ainda encontrá-los aqui e ali, e poder abraçá-los cheio de saudades. A história da despedida foi, pelo menos para mim, mais suave do que poderia imaginar. As conversas com os pastores e os emails desconfiados geraram, como seria inevitável, certa tensão e desconforto. Mas o tempo foi soprando o nevoeiro e, aos poucos, o ambiente foi ficando iluminado. Tornou-se claro, e aqui falo unicamente por mim, que os caminhos não eram mais os mesmos e não nos permitiam mais seguir lado a lado. Minha cabeça e coração já estavam muito distantes do modelo formal, repleto de cuidados, de excesso de zelo pelo desejo de manter o povo unido e as engrenajens funcionando - e são tantas engrenagens, tantos ministérios, reuniões, assembléias, planos, projectos, números e gráficos. Tudo bem intencionado, creio, mas com o propósito claro de crescer, aparecer e permanecer. E eu já venho há muito sonhando com o diminuir, dispersar, desaparecer e sumir. Sei que para muitos isso parece exagero (afinal, a 'igreja' que abandonei não é nem de longe adepta das loucuras do mundo gospel, nem da manipulação descarada e bandida de malafaias e terranovas que querem mesmo é enriquecer à custa da cegueira da multidão, tangida de um lado para outro como gado em pasto seco). Mas não creio que seja. Um pouquinho só de fermento leveda a massa toda. O chamado que um dia aceitei seguir porque me atingiu em cheio o coração e encheu-me de alumbramento, é o chamado para sumir. O que ecoa no meu peito são as palavras de dispersão. Vão - disse o mestre - sejam sal, sejam luz, sempre indo, caminhando, espalhando, dispersando, sumindo na multidão. Sal se dissolve e some. Dá gosto mas, depois que é espalhado, ninguém mais sabe onde está. Sumiu, mas salgou. Luz não se pega, não se toca, ninguém sabe descrever sua aparência. Sabemos que há luz porque tudo se torna visível - mas não sabemos onde ela está, não podemos tocá-la, descrevê-la. Não. Não desprezo o ajuntamento nem a comunhão. Mas eles não tem nenhum valor se não forem frutos do desejo intenso do reencontro amoroso dos dispersos cheios de saudade. Um reencontro banhado na expectativa de compartilhar histórias boas e ruins da dispersão e, assim, de modo simples, livre e natural, aprender e crescer na fé. Mas são breves paradas, como a cervejinha no boteco, e não como a agenda profissional de um homem de negócios. Como aquilo que enche meu coração vaza pela boca, nos últimos tempos passei realmente a ser, e continuo aqui falando unicamente por mim, um incômodo para o grupo. Sempre 'do contra', muito disperso, pouco participativo, pouco engajado. Estava dando um baita mau exemplo. 'Cuidado com o Tuco', é o que diziam aqui e ali, cheios de zelo e cuidado. O engraçado é que minguém se interessou pelo que eu fazia fora da igreja - isso parece não ter a menor importância. Então, para não ficar nessa lenga-lenga, causando indisposição e perturbando gente boa e bem intencionada, achei melhor me afastar. E com isso, creio, me libertei e libertei quem ficou. Cada um livre para seguir sua jornada da maneira como lhe brota no coração. Actualmente engrosso a fileira das estatísticas dos 'sem igreja'. Obviamente sei que não é possível estar com Jesus e ser um 'sem igreja' a menos que se defina igreja como uma coisa palpável e descritível. Para ser 'sem igreja' precisaria crer que posso possuir uma, ou pertencer a uma. O discípulo de Jesus (e como eu quero ser um!) quando se encontra com mais um ou dois, é igreja. O verbo adequado é ser, não ter ou estar. Assim, aos amigos cristãos membros de uma igreja formal, talvez até aquela da qual fui membro até mês passado, que porventura estejam preocupados comigo, relaxem. Continuo buscando proximidade com o Pai e sendo igreja dEle, galhinho verde vibrando viçoso no ramo da videira. Continuo na trilha que só Deus sabe onde vai dar.
Fonte: Blogue A Trilha