“Não se pode esperar que um homem que vive num monte de esterco cheire a rosas.”
(Aravind Adiga, O Tigre Branco, Ed. Presença, p 34)
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A política portuguesa está mergulhada num lamentável lamaçal de incompetência, oportunismo e corrupção como talvez nunca antes.
Multiplicaram-se nos últimos tempos os sinais de alerta, e os cidadãos bem formados têm cada vez mais dificuldade em rever-se na postura pessoal e nas más práticas da nossa classe política. Cada vez fica mais claro que, não estivéssemos nós na União Europeia e na NATO já tinha havido um golpe de estado, tal é o ponto a que as coisas chegaram, trinta e cinco anos depois do fim do regime autoritário que nos governou por quase meio século.
Quando um sistema fundamental em democracia como o sistema judicial não funciona,
quando o ensino está no caos que se vê,
quando quase não existe verdadeira iniciativa privada no país, estando os empresários e empresas eternamente dependentes dos negócios do Estado,
quando a promiscuidade entre política e negócios campeia,
quando vários candidatos a deputados e autarcas foram condenados em tribunal e outros estão à espera de julgamento,
quando os líderes políticos fecham os olhos a esta vergonha (com a honrosa excepção de Marques Mendes),
quando os polícias desrespeitam a própria farda ao fazer manifestações para atirar os bonés ao chão,
quando um representante dos interesses farmacêuticos trata o primeiro-ministro abaixo de cão, em público, de forma insultuosa e difamatória por alegada estratégia,
quando os governantes não se sabem dar ao respeito nem evidenciam sentido de Estado,
quando a oposição nada faz para se constituir como alternativa válida e credível ao governo da nação,
quando o presidente da república protege os amigos para lá dos limites do eticamente aceitável,
quando o governo acha possível implementar as tão necessárias reformas em oposição a grande parte da sociedade,
quando as formações partidárias não sabem fazer política a não ser com golpes baixos e atroz demagogia,
quando os sindicatos estão desfasados do tempo e se comportam como partidos políticos anti-governo, seja ele qual for,
quando alguns banqueiros se comportam como criminosos de colarinho branco,
quando os eleitos não se conseguem pôr de acordo no sentido de legislar dura e preventivamente contra a corrupção, mas apenas de legislar no sentido da defesa dos seus interesses particulares,
quando o sentimento geral de insegurança e impunidade cresce de forma geométrica,
quando o ensino superior está na confusão, na inadequação, na incompetência funcional, na inoperância e no divórcio do mercado de trabalho em que se encontra,
quando uma unidade de saúde pública não assume as suas responsabilidades, e a culpa parece ir morrer solteira, mais uma vez, como está a acontecer com o episódio dos doentes que cegaram em Santa Maria,
quando o futebol parece ser a coisa mais importante na vida deste nosso pobre país,
quando a corrupção cresce como ervas daninhas por todo o lado,
digam-me lá como é que o país pode cheirar a rosas?…
Via A Ovelha Perdida