Nasci e cresci, como cristão e como homem, no seio de uma comunidade cristã-evangélica de matriz pentecostal. Não renego as minhas origens cristãs, a minha matriz pentecostal e boa parte do que recebi nessa comunidade e que, afinal, marcou indelevelmente o que sou hoje. Discordei sempre de muita coisa mas fi-lo sempre frontal e lealmente. Nunca disse pelas costas aquilo que tinha que dizer face a face. Assumi sempre as minhas responsabilidades na Obra de Deus e no serviço do Reino em consonância com os talentos recebidos. Nunca exacerbei o meu posicionamento espiritual no seio da minha comunidade e jamais me coloquei em "bicos de pés" apenas para ser visto. O exercício da minha fé foi sempre na direcção da utilidade e do serviço ao meu Senhor e à igreja que me reconheceu isso e me comissionou unanimemente para o ministério da Palavra. Nunca tive a pretensão de estar certo em tudo, mas também nunca abdiquei das minhas convicções cristãs, desde que bem consolidadas na Palavra de Deus mesmo que isso representasse a manutenção de olhares menos tolerantes na minha direcção. Nunca fui intelectualmente ou moralmente subserviente para poder sustentar qualquer "stato quo" que me fosse eventualmente favorável. Nunca olhei a igreja e o Evangelho através de colunas de "deve" e "haver". O "Negócio de Deus" tem a ver com almas salvas, sementeira da Sua Palavra e servir sempre, a todos os homens, independente de credos, na medida das nossas forças, tempo e visão de Deus. Mercantilismo é-me portanto um conceito estranho no que à igreja diz respeito.
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Bati-me, e combati sempre com a verdade, a dissimulação, ostentação, irresponsabilidade, mentira, falsidade e outros pecados e malefícios que fui identificando, sabendo que eu próprio não sou perfeito e olhando sempre para Aquele que É a minha medida de perfeição. Nunca me detive face a aberrações éticas, espirituais e mesmo culturais que se prolongaram, diria quase "criminosamente", durante décadas, no interior da minha comunidade cristã de origem e que destruiram, espiritualmente, anos a fio, famílias inteiras. Não me calei e não me calo mesmo que isso possa representar também a tentativa do meu "linchamento" espiritual com hora marcada em qualquer Sinédrio de turno por classes sacerdotais e farisaicas de serviço a coberto de um manto de silêncio colectivo comprometido e envergonhado que prefere assobiar para o lado e passar à frente a ter uma atitude de defesa intransigente da verdade, da fé e da comunhão entre irmãos em Cristo; mas "linchamentos espirituais" até nem são uma solução original...
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Não, esta não é forçosamente uma igreja cristã. Talvez um sucedâneo barato, uma máscara de igreja. No limite, uma igreja travestida, uma religião "cristã" que convoca à prática do entorpecimento espiritual assente em rudimentos de um qualquer neo-catecismo evangélico. Uma igreja assim, com esse nome, de "igreja", não existe e, se existe, é uma farsa contada por fascículos pendurados nos cordéis da literatura popular barata. Uma igreja que ontem tudo proibia aos crentes, tivesse ou não vínculo e respaldo bíblico para tal, e que hoje destapa, de um golpe, a irracionalidade de anos de ensino e defesa de princípios controvertidos com os quais se destruiu por dentro, não pode ser "uma igreja", não pode ser a minha igreja. Nunca poderei rever-me numa igreja assim, que "resolve problemas" por atacado como se as vidas destruidas e as famílias desprezadas e marginalizadas em nome de valores e critérios irracionais e anti-bíblicos não contassem para coisa nenhuma e pudessem ser varridas para baixo do tapete, consideradas "baixas de guerra" em nome de fundamentalismos discricionários de ocasião ao gosto e sabor de quem acha que tem poderes ilimitados sobre a vida das ovelhas de Jesus. Contam e muito. Têm peso. A inscrição ou não dos seus nomes no Livro da Vida é responsabilidade de quem guiou ou consentiu na condução das ovelhas do Senhor a pastos pouco verdejantes durante anos consecutivos em nome de um farisaísmo que Jesus combateu largamente ao longo do seu ministério.
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Independente do julgamento de Cristo, a história e o tempo coam também as atitudes e os empreendimentos do povo de Deus e dos que o guiam. E houve um tempo em que a afirmação dos evangélicos se fez, quiçá por necessidade de contraponto com a religião estabelecida, pela simplicidade do discurso e pela afirmação da humildade da fé e dos princípios. Nada a dizer. Foi assim que o Evangelho cresceu e se implantou em Portugal. A descoberta e o fervor pentecostal cobriam equívocos bíblicos aos quais ninguém prestava atenção, embora estivessem lá. Todos achavam, e aceitavam, líderes e povo, que seria assim, que a direcção era essa, a da diferença marcada e sublinhada socialmente, do estreitamento das margens, da separação rígida, da negação do contacto exterior, mesmo que à custa do esmagamento cultural, da renúncia expontânea da "novidade" de fora pelo perigo da "lepra" contagiosa. O conjunto de regras éticas e comportamentais definia, às vezes, mais do que ser ou não salvo, aquilo que era um "crente". À distância, eram reconhecidos, já não pela sua humildade espiritual e afirmação viva de uma fé explosiva, constante e penetrante, que foram a matriz original onde se sedimentou o seu crescimento popular e fulgurante, mas antes por um estereótipo sociológico.
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Os "avisos" foram caindo como bombas incendiárias. O padrão ético e comportamental que nos visitava do estrangeiro era diferente, não impunha "cabrestos" estranhos nem "palas" para tapar a visibilidade do que à volta se passava, mas não deixava por isso de continuar a afirmar uma fé empolgante. O ridículo cubria-nos quando homens e mulheres, cristãos oriundos de ambientes culturais apenas separados por poucos quilómetros, entravam em território da igreja nacional. As exigências e imposições comportamentais, de acordo com o padrão local, diziam muito da transferência que estava já a ser feita, da humildade inicial da fé para o monumento comportamental erguido em seu lugar. Os anos 80 do século passado colocaram a nú a hipocrisia que se substituiu à fé e estilhaçaram uma comunidade alargada, e até então unida, em muitas outras mais pequenas comunidades que, despidas do preconceito e farisaismo souberam fazer o seu próprio percurso contextualizando a sua fé e afirmação cristã em tempos diferentes. Queiramos ou não, não há "cabresto" que possa impedir para sempre que se ouça o silvo do vento que sopra. E ele sopra onde e para onde quer . O Vento do Espírito não pode ser domado por homem algum em nome seja do que for. Mas parece que o dealbar do século vinte e os alvores do século XXI trouxeram a uma certa igreja novos ventos. Mas esta igreja corre o risco de se escancarar a tudo aquilo a que anormalmente, e anti-biblicamente, não se expôs em devido tempo e pagar por isso um elevado preço. Soa a falso, a opção avulsa. É forçada e vem a reboque de circunstâncias pouco dignificantes. É da cabeça e não do coração. Muita gente foi esmagada apenas por acreditar que a forma como se vestia ou alguns lugares inócuos que frequentava, ( só pequenos exemplos ) não tinha nada a ver com a sua afirmação de fé. Que por não se isolar, escondido na protecção da comunidade, podia mostrar, mais claramente, o que Cristo fazia na vida daqueles em quem tocava do que recolhido no seu casulo pregando para si próprio, clamando para crentes que se arrastavam para cultos sem vida duma "religião cristã" hibernada, sem chama nem fulgor, incapaz de promover a conversão de pecadores pois os sinais que transmitiu durante tempos e tempos ficaram coados numa história a que não se deveria ter deixado amarrar, por muito significante e empolgante que tivesse sido, como foi efectivamente.Isso deixa um rasto visível e perigoso. Hoje, pela Graça de Deus, muitos homens e mulheres que compreenderam relativamente cedo a mudança do vento da história da igreja, são exemplos a olhar com respeito e consideração pelo bom trabalho espiritual feito dentro e fora de portas da igreja local, sem imposição de palas ou cabrestos, até porque disso Cristo nos Libertou totalmente. Infelizmente o libelo acusatório dos velhos e gastos Sinédrios paira ainda sobre esse conjunto de corajosos cristãos, bons leitores do vento e do tempo. As sentenças, lavradas em velhos pergaminhos, continuam afixadas nas portas da memória das suas comunidades de origem, para cujos líderes as palavras Amor, Perdão e Reconciliação, são apenas letra morta, mesmo se trazidas à Bíblia Sagrada com a força da Nova Aliança selada pelo sangue de Jesus Cristo.
Este é o meu manifesto, em síntese, na defesa da Igreja e da Fé Cristã, sem fantasmas nem papões de serviço. Diz a Bíblia que "se Cristo nos Libertar, seremos verdadeiramente Livres". É nisto que creio.
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Jacinto Lourenço