domingo, 23 de agosto de 2009

Crónica de Férias 6: A Ouvir Cigarras Contando Estrelas

A vida é feita por fases, etapas, períodos mais ou menos longos, ritmados pela constância ou inconstância das nossas escolhas. Algumas vezes são pequenos episódios ou acontecimentos plenos de entusiasmo e criatividade que nos marcam, que nos impulsionam para a frente. Outras vezes são desertos infinitos que se sucedem sem um único oásis onde pousar e recuperar forças.
Estou a meio de um período destas férias do ano de 2009, e já percebi que, querendo Deus, a partir de agora, as férias para mim não serão, provavelmente, iguais ao que têm sido até hoje . Talvez por isso decidi "sorver" cada momento vivido nestes escassos dias que levo a sul. Terei outros momentos, outros episódios, outras fases; mas há coisas que dificilmente se irão poder repetir. Não imagino se essas mudanças, que antevejo, irão ser para melhor ou pior. Só sei que trarão, com certeza, novas vivências, novas oportunidades de afirmação de vida, novas realidades de caminhos ainda não percorridos. É disso que se faz sempre o caminho que cada um de nós trilha. Não podemos ficar agarrados ao passado a viver de recordações ou à espera que ele tome conta de nós e nos paralise. Afinal a vida mostra-nos sempre trajectos novos a cada dia. Só nos resta descobrir a melhor forma de seguir por eles.
Hoje subirei um pouco mais na geografia do país. Trocarei areias finas e águas cálidas por planícies secas e calor ondulante a pedir que os corpos se refresquem continuadamente no meio do calor tórrido do alentejo que por vezes nos dificulta até o respirar.
Ouvirei concertos de grilos de ralos e de cigarras, cantados em estilo cega-rega no anseio pela vida que pode ser ganha ou perdida por entre o batimento aparentemente pouco melódico das suas asas. Perderei o olhar em campos dourados pelo sol. À noite, no alpendre, ao som das esquilas de animais em nocturnas pastagens, descobri-me-ei por entre galáxias, contando e cantando estrelas perdidas na magnitude, quietude e vastidão celeste que só os céus alentejanos me permitem. Descobrirei estrelas só minhas. Falarei com elas secretos diálogos que a natureza entende. Tomo-me de paixão por alguma mais brilhante que, cruzando o firmamento levou na sua boleia este passageiro do universo, qual cometa em vertiginoso voo sem tempo para chorar a poeira cósmica dos anos vividos ou simplesmente gastos. Então, mais uma vez, louvarei o meu Senhor pela sua maravilhosa Criação. E a coisa mais fantástica, é que posso ver essa Criação até em qualquer decadente estrela que, decidida a extinguir-se, corta o negrume da noite alentejana e se precipita nos meus braços de astrónomo sonhador e contador de estrelas.
. Jacinto Lourenço