quinta-feira, 15 de outubro de 2009

"O UNIVERSO DE EINSTEIN"

Estive ontem na inauguração do Ciclo de Conferências, "Nas Fronteiras do Universo", promovido pela Fundação Caloustre Gulbenkian, em colaboração com outras entidades ligadas à ciência. Não era a primeira vez que me deslocava ao auditório 2 da Fundação para assistir a conferências. Fui "nas calmas" , com o tempo suficiente para chegar dentro do horário, o que aconteceu. Mas as "minhas calmas" não foram suficientes para me dar acesso ao auditório, que estava repleto, tendo que ficar "confortavelmente" instalado na escadaria de acesso ao hall dos auditórios, onde as seis ou sete dezenas de cadeiras ali provisoriamente colocadas já estavam esgotadas, tendo as pessoas que continuavam a chegar depois de mim que se espalhar pelo largo espaço que frente ao retroprojector disponível que transmitia para o exterior o que se passava dentro do auditório.
Uma surpresa, para mim, quando a porta do auditório 2 se abriu, após terminar a Conferência de ontem, e centenas de adolescentes e jovens sairam de supetão. Sei que "esqueceram" a sessão de interpelações ao conferencista que, para mim, é quase tão interessante, por vezes, quanto as Conferências em si. Mas pronto, não se pode pedir tudo, e já é um princípio, e um bom princípio, ver tanta gente no início da vida interessada em ciência e particularmente em astronomia, cosmologia, ou astrofísica, como queiramos.
Perguntarão porque é que eu gosto tanto de astronomia e, de uma forma geral, de ciência ? É simples a resposta: Foi por aí que eu vim a Jesus ! Foi pela contemplação do Universo nas noites estreladas do alentejo, em criança, e pelas explicações do meu avô José sobre o mesmo, um homem formado apenas na "Academia da Vida", muitas vezes bastante "criativas", que eu achei que queria conhecer mais sobre quem tinha criado algo tão profundo, perfeito e misterioso. Depois, foi só seguir Copérnico, Galileu, Newton, Kepler, Herschel e até Kant e somar um mais um que dá sempre dois. O resultado de um Universo tão matematicamente perfeito não pode ser obra do acaso. Só uma "mente" perfeita o podia ter criado e desenvolvido.
É por isso que ontem não me importei de ficar hora e meia sentado numa escada do hall dos auditórios da Gulbenkian, sabendo que três quartos do 2 estavam preenchidos por jovens e adolescentes ávidos de ouvir sobre o Universo que aprendi a "vasculhar" e entender desde os meus dias de menino, mesmo sem ser na actualidade um especialista ou cientista na matéria, bem longe disso, aliás.
Depois, para além do mais, sabe-me bem ouvir um homem da ciência, como o Prof. Alfredo Barbosa Henriques, dizer, humildemente, que na abordagem para a compreensão do Universo "temos ainda mais problemas do que soluções" ! É isto que admiro e gosto na ciência e nos verdadeiros homens da ciência: a não presunção de que sabem tudo ou que dominam o conhecimento total sobre tudo.
É sempre bom recordar Sócrates ( não o nosso primeiro-ministro, é claro ): "Só sei que nada sei !" . Ou mesmo Immanuel Kant : “Duas coisas satisfazem a mente com crescente admiração e receio: O céu estrelado por cima de mim e a lei moral dentro de mim”.

Tamanha simplicidade é desarmante e cativante e leva-me a gostar, cada vez mais, de ciência honesta e cientistas não preconceituosos. A ciência honesta, ao contrário do que uma larga corrente da igreja cristã estatuiu, não é inimiga de Deus nem da igreja, bem pelo contrário. E bom seria que, neste domínio, o da ausência de algumas certezas e ideias feitas, a igreja tomasse o exemplo da ciência séria. Talvez isso, e a Graça de Deus, impedissem a produção de fariseísmos e legalismos inconsequentes e o Espírito Santo tivesse assim espaço para actuar mais profundamente no coração dos homens e mulheres que povoam as casas de oração de hoje.

Jacinto Lourenço

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Breve apresentação da Conferência de ontem na Gulbenkian, e do Conferencista.
Neste seminário falaremos do impacto das ideias de Einstein, em particular na Teoria da Relatividade Geral e suas aplicações na cosmologia. A cosmologia estuda o universo na sua mais larga escala, como um todo, e este estudo tem na relatividade geral o seu mais perfeito instrumento matemático. É claro que um projecto tão ambicioso só pode ser levado avante, aceitando à partida um certo número de hipóteses simplificadoras, baseadas na experiência e na observação. São estas hipóteses que definem o modelo do Big-Bang, o modelo cosmológico com maior aceitação na comunidade científica. Começaremos a palestra com uma exposição, que se pretende simples, dos conceitos básicos que definem a relatividade geral, chamando a atenção para as diferenças importantes que separam esta teoria da mecânica newtoniana. Feito isto, entraremos, então, na descrição do modelo do Big-Bang. Veremos o papel crucial que a relatividade geral tem no estudo da cosmologia, em particular na compreensão desse fenómeno espantoso que é a expansão do universo, expansão que não é uma expansão através do espaço, mas sim uma expansão do próprio espaço. Deste fenómeno da expansão poderemos tirar importantes conclusões sobre o passado do universo, sobre a história da sua evolução e sobre os fenómenos físicos que foram relevantes nesta evolução. Como não podia deixar de ser, importantes dificuldades foram e estão a ser encontradas, à medida que as nossas observações se foram tornando mais precisas e sofisticadas, exigindo a introdução de novas componentes de energia e matéria do universo, cuja interpretação é, ainda, altamente problemática. Uma das maiores dificuldades, do ponto de vista teórico, resulta da aparente incompatibilidade entre a teoria da relatividade geral e a mecânica quântica que rege todos os fenómenos físicos conhecidos, com excepção das forças gravitacionais. É aqui que nos aparece a teoria das supercordas, como tentativa de ultrapassar aquelas dificuldades, através de uma unificação de todos os tipos de forças conhecidas, baseando-se numa nova representação dos fenómenos mais elementares, mas que está, ainda, longe de nos dar resultados definitivos. O mesmo se passa com outras teorias em desenvolvimento, como seja a teoria da gravitação quântica em “loop”, de que, também, falaremos muito genericamente. Será que, da resolução deste problema, relatividade geral vs. mecânica quântica, surgirá a solução das nossas dificuldades?
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Prof. Alfredo Barbosa Henriques
Alfredo Barbosa Henriques licenciou-se em Engenharia Electrotécnica na Faculdade de Engenharia do Porto, e doutorou-se em Física pela Universidade de Glasgow, em 1976, com uma tese intitulada “Relativistic Equations for Meson Structure”. Foi bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian. Desenvolve a sua actividade docente no Departamento de Física do Instituto Superior Técnico, onde é professor catedrático, desde 1992. É investigador do Centro Multidisciplinar de Astrofísica, CENTRA/IST, de que foi um dos fundadores e primeiro presidente, até 2000. Baseado na sua actividade docente e nas suas aulas, publicou, em colaboração com o Professor Jorge Crispim Romão, o livro “Electromagnetismo”, IST Press, 2006. Recentemente, e tendo, também, como ponto de partida as suas aulas sobre relatividade e cosmologia, publicou o livro “Relatividade Geral – uma introdução”, IST Press, 2009. A sua actividade científica pode ser dividida em dois períodos, mais ou menos distintos, um que vai de 1976 a 1985/1986, e outro que vai desde 1986 até ao presente. O primeiro período foi dedicado à exploração e desenvolvimento de modelos relativistas de quarks e suas aplicações ao estudo da estrutura e espectro dos mesões e bariões. Foram publicados vários artigos sobre estes assuntos. A partir de 1986 começou a interessar-se pelos limites de baixas energias das teorias de supergravidade e supercordas, e suas consequências na cosmologia (modelos inflacionários, incluindo modelos com dimensões extra) e na astrofísica (estrelas de neutrões e estrelas de bosões-fermiões, cujo conceito introduziu). Além destes, publicou artigos científicos sobre perturbações em cosmologia. Durante uma parte deste período teve uma colaboração activa com R. G. Moorhouse (Glasgow) e Andrew R. Liddle (Sussex). Mais recentemente, em colaboração com Paulo Sá (Algarve) e Robertus Potting (Algarve), tem focado a sua investigação nas ondas gravitacionais de origem cosmológica e no cálculo do respectivo espectro. Particular atenção tem sido dedicada ao regime das muito altas frequências (MHz e GHz), pois este regime pode dar-nos, em princípio, importantes informações sobre a época inflacionária, podendo mesmo vir a fornecer-nos um teste importante dos modelos inflacionários. Tem, também, trabalho publicado na área da cosmologia quântica em “loop”. Sobre estes diversos temas tem publicado, regularmente, artigos científicos nas principais revistas internacionais de física, Physical Review, Nuclear Physics, Physics Letters, Zeit. f. Physik, Classical and Quantum Gravity, entre outras.