segunda-feira, 26 de julho de 2010

Avós: Um Valor Seguro

Celebra-se hoje, a fazer fé no que dizem os meios de comunicação, o "Dia dos Avós". Numa breve e diagonal investigação, parece-me que este dia se inspira numa tradição católica romana. Chega a sua celebração a Portugal como tem chegado a de tantos outros dias em que, mais inspiração menos inspiração, o que lhes está verdadeiramente subjacente é o objectivo comercial. Porém, se há dia que eu considero, até por razões pessoais, que deva ser celebrado, é o Dia dos Avós, e por duas ou três questões fundamentais.
Vive-se hoje numa sociedade em que o papel da família tende a esbater-se. Em que pai e mãe trabalham, e em que os avós, ao invés de serem encarados como elementos enraízadores da família, são antes vistos como um peso que se despeja num qualquer lar ao virar da esquina, e em que as razões economicistas da escolha desse lar se sobrepõem às razões de qualidade de vida e humanidade com que os idosos devem ser tratados. Todos os dias os meios de comunicação nos dão notícia do desprezo e ausência de sensibilidade humana mínima a que são votados muitos idosos, quer por quem os acolhe, quer pelas famílias que se "esquecem", literalmente, dos seus familiares, passando-se por vezes anos sem que os visitem nos lares de acolhimento. É dramático e chocante assistir a isto.
Não quero nem devo iludir o facto de que em muitos casos os filhos não têm outra alternativa ao internamento dos pais em lares. Mas se o têm que fazer, devem fazê-lo com a dignidade, humanidade e respeito que estes merecem, quanto mais não seja, porque se sacrificaram, ao longo de uma vida, por proporcionar aos filhos a qualidade de vida e educação que eles próprios, na maioria dos casos, nunca tiveram. Felizmente, identifico muitos casos em que filhos e famílias cuidam e integram no seio familiar, de maneira extremosa, os seus pais e avós.
Há umas décadas atrás, os idosos eram encarados como um valor importante no seio familiar. Um esteio, um factor de transmissão de valores e conhecimentos, elementos cuidadores e ensinadores das gerações mais jovens. Nas sociedades mais primitivas sempre houve esse olhar sobre os mais velhos. Nas sociedades modernas parece que, afinal, nada disso é já importante e os idosos são olhados como desnecessários e completamente descartáveis.
A minha experiência pessoal é a de quem foi criado e educado pelos avós a partir dos seis anos de idade. Dou graças a Deus porque o amor que os meus avós e a minha família me dedicaram, não permitiu que eu sentisse grandemente a ausência dos pais. Foi-me consagrado pelos meus avós, o mesmo amor e cuidado que já tinham dedicado aos seus filhos. Numa determinada altura, eu senti-me mesmo como um pequeno "príncipe" no meio de tantos cuidados e afectos que me eram dispensados. Devo muito aos meus avós. Sei que a sua vida teria sido um pouco diferente se não tivessem que, depois de criados sete filhos, terem que criar e educar mais um neto. Não me consta que alguma vez se tenham queixado desse facto. E tenho a certeza de que muitas vezes tiveram razões para isso, em especial porque o seu relacionamento, em busca do melhor para mim, com os meus pais, não foi fácil, ou mesmo porque a minha entrada na adolescência e fase inicial da juventude também lhes não facilitou a vida.
Dos meus avós, não me lembro de alguma vez ter recebido um açoite ( e se recebesse teria sido provavelmente merecido, porque como também diz o adágio, "quem dá o pão, dá a educação" ), apenas cuidado e carinho. Lamento que tivessem partido cedo, que eu não tivesse usufruido, por mais tempo, da sua companhia.
Não me lembro de quantos brinquedos me compraram, mas lembro o amor que me dedicaram, os meus avós, enquanto viveram.
Hoje, na certeza de que os avós devem voltar a ser encarados como um valor seguro de enraizamento familiar e como cuidadores preferenciais dos netos, deixo aqui esta homenagem pública aos meus avós maternos e a tudo aquilo que ao fim de muitos anos ainda representam para mim, mesmo estando ausentes fisicamente.
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Jacinto Lourenço