“Os S.S. pareciam mais preocupados, mais inquietos do que de costume. Enforcar uma criança diante de milhares de espectadores não era uma coisa qualquer. O chefe do campo leu a sentença. Todos os olhos estavam pregados no menino. Ele estava lívido, quase calmo, mordendo os lábios. A sombra da forca se projetava sobre ele.
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Dessa vez, o lagerkapo negou-se a servir de carrasco. Três S.S. o substituíram.
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Os três condenados subiram em suas cadeiras. Os três pescoços foram introduzidos nos nós corrediços ao mesmo tempo.
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- Viva a liberdade! – gritaram os dois adultos.
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O pequeno, calado.
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- Onde está o bom Deus, onde Ele está? – alguém perguntou atrás de mim.
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A um sinal do chefe do campo, as três cadeiras foram derrubadas.
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Silêncio absoluto em todo o campo. No horizonte, o sol estava se pondo.
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- Descubram a cabeça! – berrou o chefe do campo. Sua voz estava rouca. Quanto a nós,
estávamos chorando.
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- Cubram a cabeça!
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E começou o desfile. Os dois adultos não viviam mais. Suas línguas pendiam, grossas, azuladas. Mas a terceira corda não estava imóvel: tão leve, o menino ainda vivia…
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Por mais de meia hora ele ficou assim, lutando entre a vida e a morte, agonizando sob nossos olhos. E tínhamos de olhá-lo bem de frente. Ainda estava vivo quando eu passei diante dele. Sua língua ainda estava vermelha; seus olhos, ainda não apagados.
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Atrás de mim, ouvi o mesmo homem perguntar:
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- E então, onde está Deus?
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E senti em mim uma voz que lhe respondia:
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- Onde Ele está? Ei-Lo – está aqui, nesta forca.”
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Fonte: Elie Wiesel em A Noite *** via Laion Monteiro