sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Flávio Josefo : Colaboracionista de Roma ou Patriota Judeu ?

...Observando a vida de Josefo, podemos perceber facilmente o seu comprometimento, não apenas com a cultura greco-romana que enquadrava o Mediterrâneo Oriental no séc. I da era cristã, mas também com o próprio establishment político, tanto em Roma como na Judeia. A sua acção limitada, apesar de consequente, durante a grande revolta dos Judeus, iniciada em 66 d.C., mostra-nos isso mesmo, como veremos adiante. Com efeito, a acção e o trabalho historiográfico de Josefo desenrola-se em duas frentes. Se, por um lado, procura comunicar com o mundo greco-romano e helenístico oriental em que se integrou, e que dominava a civilização do Mediterrâneo Oriental no seu tempo, por outro lado, contudo, não deixava de procurar também preservar a sua ligação com o mundo judaico que o viu nascer. Como diz G. Mader: «...the historian “between Jerusalem and Rome” engages his Greco-Roman readers in their own terms, gives plausibility to an interpretation designed to deflect animus and criticism from the Jews as nation, while at the same time explaining the Romans to the Jews» (Mader, 2000: 147).
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Dois anos antes do eclodir da insurreição judaica do ano 66, Josefo fizera parte de uma embaixada enviada a Roma com o intuito de libertar alguns sacerdotes judeus cativos na urbs. Auxiliado por um actor aí residente, chamado Alituro e, ao que consta, pela própria esposa de Nero, Popeia Sabina, consegue levar a cabo a sua missão com bastante sucesso, tendo mesmo recebido presentes de Popeia como sinal de reconhecimento (Vida, 3.16). A sua ligação a Roma inicia-se, com toda a probabilidade, a partir dessa altura, revelando-se ainda mais estreita no decurso da rebelião que se avizinhava. Chegou-se até mesmo a afirmar, se de facto não se iniciou aí, na viagem que fez a Roma, uma ligação política que influenciaria o comportamento de Josefo durante a rebelião [...]. Existindo ou não, a partir desse momento, uma militância de Josefo em colaborar numa integração pacata da Judeia no mundo romano, a verdade é que a sua observação da realidade política e social de Roma tenha talvez favorecido a sua ligação, não apenas cultural, mas também política, com o Império; ou, pelo menos, a boa vontade que demonstrou em integrar-se no mundo romano e helenístico.
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O colaboracionismo velado de Josefo e a sua duplicidade, antes e durante a guerra é, de resto, assumido pelo próprio na sua autobiografia; ainda antes do eclodir do conflito, face à turbulência dos mais radicais, afirma que, reunido com a elite sacerdotal e os Fariseus, decidiu-se simular o apoio aos insurrectos, de forma a preservar no imediato as suas posições internas: «dado o claro e actual perigo para nós próprios, dissemos que concordávamos com as suas opiniões» (Vida, 5.22). Tratar-se-ia claramente de uma manobra em que as elites moderadas acediam à pressão dos insurrectos para os melhor poder controlar. Uma elite que, atemorizada com os levantamentos de forte base popular, procurava sustentar a sua própria posição, fazendo um jogo duplo enquanto esperava pela salvação vinda de Roma, possuidora da força militar necessária para estabilizar a situação: «Fizemos estas coisas antes de Cestius8 chegar com uma grande força para acabar com a rebelião» (Vida, 5.23).
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Com efeito, Josefo acabou por ser designado para liderar a defesa da Galileia, assim que as coisas tomaram irremediavelmente o rumo da violência. O cerco movido pelos Romanos a Jotápata, lugar em que se entrincheirara com as tropas a si consignadas, teve o desfecho que se esperava no ano de 67: a cidade é tomada e os seus defensores renderam-se aos Romanos. O que surpreende neste episódio é a argumentação utilizada por Josefo, que lhe permitiu não apenas salvar a vida, mas também sair beneficiado da aventura. Perante Vespasiano, que assumia ainda a posição de general ao comando dos sitiantes, Josefo afirmou que Deus lhe teria confidenciado em sonhos que a Fortuna estava ao lado de Roma e que esta traria a vitória às legiões. Mas ainda vai mais longe: afirma mesmo que o conquistador de Jotápata se tornaria, um dia, imperador: «Pensas que Nero e aqueles que lhe sucederem, antes da tua acessão, irão continuar? Tu serás César, Vespasiano, tu e o teu filho aqui presente» (GJ, III, 401). [...]
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Fonte: Marcel Paiva Montes, Revista Sapiens, Os Essénios na Obra de Flávio Josefo - Algumas Considerações, sob a perspectiva da Utopia