quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Batman e a Teologia do Medo

A arma mais eficiente de Batman não está guardada no seu traje, nem no seu carro, nem na caverna onde aperfeiçoa as suas técnicas de luta. Também não é de outro planeta, presente de algum alienígena, e nem foi desenvolvida nas modernas indústrias de Bruce Wayne. É resultado de muito estudo, e sem essa arma Batman não seria o mito que conhecemos.

Ela é tão eficiente que compensa a falta de capacidades extra-humanas e é mesmo usada até contra os aliados do herói, opinião unânime entre os guionistas das histórias do personagem. Basta qualquer um aproximar-se do homem-morcego para sofrer os efeitos dela.

A arma mais eficiente de Batman é o medo.

“Criminosos são supersticioso e covardes; então o meu disfarce deve ser capaz de levar terror aos seus corações; eu devo apresentar-me como uma criatura da noite, negra, terrível (...) Eu devo tornar-me um morcergo.”

Esta frase clássica do herói está na sua origem. É assim que Bruce Wayne justifica a sua decisão pelo traje do homem-morcego. Movendo-se pela escuridão, com habilidade alcançada por um treino intenso, Batman surpreende os marginais. Quando os encontra, se ainda estiverem conscientes, não vão conseguir esconder nada. Nem dinheiro, nem drogas, nem a mais sigilosa informação. Não é preciso ser rápido, nem selvagem.

Frequentemente, o cavaleiro das trevas não diz nada. O medo invade o ambiente assim que sua presença é notada. Tem sido assim desde que ele começou o seu caminho, como está registado na história “Ano Um”:

“O traje funciona melhor do que eu esperava; eles ficam estarrecidos e dão-me todo o tempo do mundo”.

Parece que Batman faz escola, no cristianismo. Usar essa mesma arma também é uma habilidade que alguns líderes religiosos vêm desenvolvendo, à altura do herói da banda desenhada. Do alto dos púlpitos(…), plantam o medo no coração dos cristãos.

Encontram terreno fértil, assim como Batman, nos corações supersticiosos, que se movem longe das leis – da lei de Deus e da lei dos homens – e nas mentes pouco informadas. Ao contrário do herói, à luz do dia, sem qualquer vergonha, pregam a “ilusão santa”. É obedecer, cumprir, seguir, ofertar, cantar – para ganhar, crescer, alcançar, curar. Uma coisa está sempre dependente da outra.

“Não recebeu a benção? Tome cuidado, examine a sua vida! Tem aí um pecado não confessado!” “Você continua a tropeçar por causa do pecado? Continue a brincar com Deus, um dia Ele perde a paciência consigo!”

“Deus está de olho em si, no que é que você está a fazer?”

“O diabo está ao seu redor, no seu trabalho, na sua casa, até aqui na nossa igreja!”

“Não veio à igreja para ir ao cinema? Um dia Deus vai cobrar-te isso!”

Tudo isto pode ser verdadeiro.

O temor de Deus aparece na Bíblia desde o Éden: “Respondeu-lhe o homem: Ouvi a tua voz no jardim e tive medo, porque estava nu; e escondi-me'” (Gênesis 3:10). Ao longo do Velho Testamento, o Senhor deixou claros os motivos pelos quais o devíamos respeitar.

Alguns, por falta de temor, sofreram. É verdade, o povo tinha medo de Deus. Até que Ele resolveu mostrar de que forma gostaria de se relacionar connosco. E o professor, o Mestre, foi o próprio Filho. Porque ninguém sabe mais a respeito de um Pai, que o filho que conviveu com Ele desde o princípio.

E o que o Filho nos ensinou é que a nossa relação com Deus não deve ser orientada pelo medo. O respeito e temor em relação ao Criador, face ao reconhecimento da sua grandeza e justiça, é um dever cristão. Porém viver como se a mão poderosa de Deus nos aguardasse atrás da porta, pronta a esmagar-nos, e não houvesse solução alguma, é desprezar o sacrifício da cruz. O cristão tem que viver em santidade por amor a Deus, e não pelo medo da sua condenação.

Quando Jesus deu a vida por nós, pondo fim a qualquer intermediação entre o ser humano e o Criador, também nos deu a possibilidade de nos aproximarmos diariamente de uma fonte de perdão e amor.

Se você já foi a uma piscina, deve ter verificado que em alguns lugares só é possível entrar na água depois de caminhar por um tanque rasteiro, para os pés, ou mesmo passar por um duche, para o corpo. É aí que somos sumariamente lavados de alguma sujidade, para que não se contamine a água da piscina.

A “teologia do medo” vive de pregar, enfaticamente, que os nossos corpos vão sujar a água, e esquece-se de defender a “lavagem” a que nos é oferecido para mergulharmos em profudidade na vida.

“No amor não há medo, antes o perfeito amor lança fora o medo; porque o medo envolve castigo; e quem tem medo não está aperfeiçoado no amor” (I João 4:18).

Temos que trocar o medo pelo amor. O medo está directamente com o castigo e a culpa. E a culpa, às vezes, esconde uma frustração pessoal de não se alcançar uma perfeição religiosa.

Será que Deus não sabe que jamais seremos perfeitos? Será que nós não sabemos que é impossível alcançar um padrão de santidade, sem jamais errar? Será que o medo nos faz esquecer a benção que há em receber o perdão de Deus?

“Pastor, não consegui, eu pequei novamente”, disse a mulher, assim que entrou no gabinete. Trazia um rosto de medo e arrependimento, e aguardava uma repreensão. O pastor respondeu com amor: “Glória a Deus, porque você reconheceu isso; e saiba que não vai ser última vez que tropeçou, mas tantas quantas as vezes que ainda precisar, pode contar com o amor de Deus para perdoar e dar-lhe uma segunda oportunidade . Não tenha medo”.

In “Deus no gibi”

Colaboração: Francisco Salerno Neto

Via Pavablog

Adaptado ao português usado em Portugal por Ab-Integro