quinta-feira, 7 de julho de 2011

Uma Babel Económica



Já o disse anteriormente, tenho paixão pelo mediterrâneo, pela história do mediterrâneo  e pelas culturas mediterrânicas. Gosto da comida mediterrânica, das pessoas do mediterrâneo e da forma descontraida como os mediterrânicos, em geral, encaram a vida. O mediterrâneo, quando não esteve no centro,  ficou próximo dos lugares que viram nascer a  civilização ocidental, tal como a conhecíamos, pelo menos,  até há pouco tempo.


Não gosto de assistir ao que está a acontecer aqui, nesta região berço de civilizações. Por tudo  isto , é com grande apreensão que vejo  alguns países desta região do mundo, nomeadamente Portugal e Grécia (e os mais que se lhe seguirão), países de seculares culturas e desbravadores de mundos, serem achincalhados e enxovalhados por uma "nova civilização" que se ergue hoje em nome de um capitalismo completamente selvagem, desregulado e terrorista e que ataca ferozmente esta zona do mundo munido de argumentos obscuros e indecifráveis ao serviço de interesses igualmente obscuros que já não se contentam apenas com empresas ou organizações; o seu alvo são países e  regiões, as pessoas não contam neste jogo de cifrões, o seu objectivo é  proceder à liquidação para dominar por completo as  economias. Quem está por detrás disto ? Há quem lhe chame "mercados", que no fundo nada mais são do que especuladores particulares da alta finança, grandes bancos, fundos de pensões de várias origens, fundos de investimento, etc que perderam todo o pudor  e atacam inescrupulosamente a coberto de alegadamente estarem apenas a fazerem negócios. Gente que não está interessada em gente, culturas ou história dos povos que vivem nos países que têm na mira para  liquidar afim de  poderem depois comprar a preço de saldo. Não, nada disso lhes interessa, o seu interesse resume-se a poucas  palavras: "lucro", dinheiro, mais valias desonestas e especulativas a troco de vidas e nações hipotecadas. Esta "nova civilização" que se ergue em cima dos destroços de milenares países ataca ferozmente usando modernos aríetes, a que  dá o nome de "agências de rating", para derrubar as frouxas defesas de nações  pouco preparadas para sobreviver neste contexto de economia globalizada e mais ainda se os respectivos governos não conduzem políticas que possam obviar ou minimizar os impactos desse mundo global da economia .


A União Europeia, dominada por países da europa central que compõem o  eixo franco-germânico e anglo-saxónico, e agregando países satélites que se regem pela mesma cartilha, porque lhes interessa dizer o que o eixo diz, numa atitude de bajulação política e económica, está confortável com a situação; joga em dois tabuleiros e faz a economia correr a seu favor, ofende os mais fracos, chamas-lhes calaceiros, desorganizados,  para além de  outros epítetos menos favoráveis. Integra a "nova civilização" global que lucra com a situação,  e  usufrui do melhor que o mundo mediterrânico lhe oferece: sol, boas praias, boa comida mediterrânica, cultura, gente simpática, relaxe e bons hotéis, enfim, boa vida que o dinheiro pode comprar aqui à beira deste velho mediterrâneo, e o dinheiro, como é bom de ver, não tem rosto nem alma ou coração, gasta-o quem o tem e ninguém perguntará como o obteve, mesmo que venha sujo. Mas construir uma "nova civilização" baseada no poder do dinheiro comporta riscos elevados, desde logo porque o dinheiro é como "um cão que não conhece o dono"; deixa-se afagar facilmente por qualquer mão  sem se afeiçoar a ninguém. 

Esta "nova babel" económica vai cair com estrondo, porque,  parafraseando  o adágio, o sol não é propriedade particular de ninguém e a europa corre um sério risco de, a breve prazo, se a situação não se inverter,  dividir-se em dois perigosos blocos: o norte rico e o sul pobre. A miséria ou a opulência nunca serão boas conselheiras quando o que se pretende atingir é um maior nivelamento económico.   As políticas económicas e sociais na União Europeia têm que ter obrigatoriamente em conta a realidade de todos os países e não apenas do grupo restrito dos mais ricos. Se o objectivo não for esse, então é melhor voltar à primeira forma europeia de cada país com a sua realidade e as suas fronteiras procurando cada um o seu próprio caminho  para o desenvolvimento e bem estar das populações numa via pacífica e harmoniosa em respeito por todas as outras nações. No fundo, foi o que faltou neste mundo globalizado, nesta  "nova civilização": respeito pelos diferentes povos e pelas suas realidades, o respeito que não pode ser medido pelo maior ou menor grau de riqueza ostentado. Portugal e Grécia, Espanha, Itália e mesmo Irlanda, merecem no mínimo o respeito pela sua história e por tudo aquilo que já deram, e podem ainda vir a dar ao mundo e à Europa, mesmo se cometeram erros que os ajudaram a cair na situação económica e social em que se encontram .  


Jacinto Lourenço