segunda-feira, 20 de junho de 2011

O Pedido de Salomão


A vida é feita de intermitências, não é seguida, não obedece a um projecto rígido ao contrário daquilo que tantas vezes escutamos. A vida não é uma coisa plana e pode até ser feita de íngremes e complicadas subidas e, sem que cheguemos todavia ao topo, dar-se no percurso uma repentina, perigosa e acidentada descida. Por muito bem que a desenhemos e projectemos tudo pode ir parar ao cesto dos papéis inúteis, rasgado ou amarfanhado. A melhor ciência que possamos escolher para delinear os dias que nos são dados viver, nada pode contra a sua  imponderabilidade e  repentismo. A vida é afinal uma equação com muitas incógnitas e nem nós sabemos quantas, pois uma sucede a outra como se fosse um jogo de escondidas em que ao valor do "x" se acrescentam linhas, potências, radicais e tudo com o objectivo de desafiar a nossa inteligência para superar o labirinto que se segue. Talvez porque a vida é assim, e sempre foi assim em todos os séculos que já foram vividos por pessoas com outras visões, culturas e direcções, é que o nosso pedido a Deus,  para podermos viver esta vida, devia ser como o pedido que Salomão fez. Sabedoria, Senhor, sabedoria é o que eu quero Senhor. Sabedoria para poder discernir o coração dos homens e de Deus, e as coisas complicadas que a equação dos dias nos põe à frente e perante as quais nos sentimos meninos incapazes de encontrar o valor das incógnitas que se ocultam de nós.

De que serve  revelarem-nos o resultado final da equação da vida se não tivermos a sabedoria que baste para descobrir os caminhos  de como se chega  lá ?  É por isso pertinente e relevante o pedido de Salomão. Sabedoria para viver e descobrir caminhos com que as equações  da vida nos confrontam. Tanta coisa para pedir e o novo rei pediu só sabedoria. E foi sábio, Salomão, enquanto viveu dessa sabedoria que lhe foi dada por Deus. Resolveu equações de grau elevado de dificuldade a contento do seu reino e da sua vida. E Salomão nunca deixou de ter sabedoria, o que desistiu foi de ter  a sabedoria que havia pedido a Deus. A sua própria sabedoria só lhe trouxe falta de ciência. Não mais foi capaz de resolver equações. O seu reino, a sua vida, tornaram-se um labirinto para o qual nunca encontrou uma saída. A descida, no seu percurso pessoal, foi acidentada, penosa e dolorosa. Sem a sabedoria que pedira a Deus, o projecto de vida de Salomão, foi parar ao cesto dos papéis amarfanhados e rasgados da história. 



Jacinto Lourenço