terça-feira, 24 de maio de 2011

A Falsidade dos Postais Ilustrados...


Gosto da Grécia, aliás, gosto de tudo o que tenha a ver com Mediterrâneo. É a região do mundo que mais me atrái. Quando penso em Mediterrâneo, penso em cultura, cores, cheiros, sabores, azul, amarelo areia, verde, gastronomia inigualável em sabor, diversidade social.

Embora Portugal seja um país mais atlântico que mediterrânico, foi daqui, do Mediterrâneo, que os nossos navegadores tiraram a ideia de partir para outros oceanos em busca de novas terras, gentes e negócios. O Mediterrâneo é o berço e matriz da civilização europeia. É por isso que gosto da Grécia, como gosto da Turquia, tal como gosto de Espanha ou Itália e de quase todos os povos e países que partilham connosco esta casa comum que já foi o maior polo de transacções comerciais europeu e mesmo mundial e de grandes descobertas científicas e realizações culturais que enformaram o mundo ocidental.

Há dois anos atrás, estive na Grécia em turismo. Percebi na altura, e comentei com diversas pessoas das minhas relações, de que a Grécia, pelo menos a que visitei, me fazia lembrar Portugal há 20 ou 30 anos atrás. O problema é que estávamos em 2009...

Hotéis de 5 estrelas, resortes e praias circundados por mato e resíduos de toda a ordem. Lixo em montes nas praias de areias douradas e nas ruas de vilas balneares. Falta de zelo e muito improviso mesmo para receber turistas. Na ilha de Kós, por exemplo, num dos seus mais importantes conjuntos monumentais , o mato que ladeava as ruas que percorriam a milenar escola de Hipócrates era capaz de ter para aí perto de dois metros de altura, envolvendo e ocultando algumas ruínas e estátuas. Pese embora tenha pago 4 euros pela entrada e não os tenha dado por mal empregues, não gostei do que vi, ou do que não vi no meio do capim. No centro da cidade, outros núcleos museológicos a céu aberto apresentavam um confrangedor abandono e ostensivo grau de desleixo e lixo espalhado por todo o lado, pese embora ostentassem antigas placas  que davam conta dos investimentos que a união europeia supostamente ali tinha feito... Não consegui perceber onde, para além das ditas placas, tinham os gregos gasto o dinheiro desses investimentos...

Não quero que passe a ideia que toda a Grécia possa ser assim, provavelmente existirão, outras ilhas, outros lugares, outras cidades mais cuidadas e apresentáveis e que tenham sido objecto de boa aplicação de fundos estruturais. Mas não deixei de pensar nos postais que habitualmente compramos em qualquer viagem turística e também nos que me habituei a ver com paisagens gregas de eleição que nos "esmagam" pela sua beleza. Fotografei alguns locais assim, mas desviei a objectiva do lixo circundante e as minhas fotos ficaram quase parecidas com esses postais. A Grécia, não deixará sempre de ser um lugar de eleição, por todas as razões conhecidas, e não necessariamente apenas pelas turísticas, mas eu fiquei a perceber que uma coisa são postais ilustrados com fotos tiradas em ângulo fechado e outra coisa é o que os nossos olhos realmente vêm em ângulo aberto. Hoje, quando o governo grego afirma que é bem possível que este país entre em bancarrota em finais de Junho, se não houver uma nova ajuda que depende de um renegociação da dívida grega, não tenho dúvidas que o que aconteceu com os gregos foi algo semelhante ao que aconteceu com Portugal no que respeita à aplicação dos fundos de coesão, que deviam ser estruturais e estruturantes, mas com uma pequena diferença: Portugal, apesar de tudo, deu um salto qualitativo quando comparado com a Grécia na aplicação desses fundos, pese embora tudo aquilo que conhecemos sobre burlas e desvios criminosos dos dinheiros comunitários, daí que a Grécia me tenha parecido Portugal antes da chegada dos milhões dos fundos de coesão na década de 90 do século passado. Hoje é praticamente impossível ver em Portugal o que eu vi na Grécia; do mal o menos. Hoje eu percebo porque é que os gregos estão tão mal e o resgate económico é capaz de não lhes resolver problema nenhum nem evitar a bancarrota que transportará consigo  o risco inerente de esse problema afectar toda a europa comunitária, em particular os que têm economias no fio da navalha. Os especuladores financeiros mundiais não perdoam nem à sua própria mãezinha e  os gregos, para além de iludirem as contas públicas durante anos a fio, e por consequência os ditos especuladores,  iludiram-se a si próprios, roubaram-se a si próprios e à oportunidade única, quiçá, de terem feito da Grécia um verdadeiro postal ilustrado de desenvolvimento baseado nas suas maiores potencialidades. Seguramente hoje estariam muito melhor do que nós.  E ali do outro lado da fronteira, pertíssimo, a bela cidade turca de Bodrum ( antiga Halicarnasso ), com tudo a cintilar de luz, cuidado, asseio, simpatia, cores e cheiros à beira de um Egeo cujo azul nos enche a alma de desejos e anseios.



Jacinto Lourenço