A revista "Notícias Sábado", que acompanhava o Diário de Notícias e o Jornal de Notícias deste passado sábado, publicou algumas entrevistas com estrangeiros que se encontram a trabalhar à mais ou menos tempo em Portugal e em que estes revelam as suas opiniões sobre o país e os portugueses. Curioso é que as suas respostas são quase coincidentes, mesmo não se conhecendo uns aos outros ou trabalhando muito distantes uns dos outros.
De vez em quando já tenho lido outras entrevistas ou reportagens semelhantes e constato que os resultados não são diferentes destes agora publicados. Dou atenção às opiniões, porque são desapaixonadas e partem de pessoas cuja capacidade de observação não foi contaminada pelos vícios portugueses e porque são feitas a partir do distanciamento que lhes é facultado por uma cultura e realidade algo diferente da nossa.
Judith Bauer é alemã e está em Portugal há cerca de onze anos a trabalhar na construção e reparação de violinos, violoncelos e outros instrumento de cordas: "Em Portugal o pior é a burocracia. As pessoas tratam-se por senhor doutor e por senhor engenheiro e não pelo nome próprio e depois como há muitas leis tudo se complica.[...] Não tenho nenhum português a trabalhar comigo[...]. Na Alemanha, uma pessoa que entra às 08h-00 está no trabalho às 07h-50 e às 08h-00 já está a trabalhar. Aqui, às 08h-00 toma-se o café, depois fala-se com o colega e talvez às 09h-00 se comece a trabalhar. Claro que antes do almoço ainda há uma pausa para o café.[...] Em Portugal as coisas não funcionam porque as pessoas fazem quase tudo a fingir. Na cabeça de muita gente não está presente a ideia de que é preciso trabalhar bem e com eficácia. O que é preciso é ser visto."[...]
Sanna Niyyssölä é mestre em musicologia e está em Portugal à procura de trabalho. Apaixonou-se pelo país após ter feito a sua tese de mestrado sobre o fado vadio durante 10 meses. Foi apresentá-la a Helsínquia e voltou. " Temos de trabalhar, cá é tudo mais relax e às vezes precisamos de perguntar as mesmas coisas muitas vezes para conseguirmos uma resposta.[...] Os portugueses também precisam de ser persistentes. Quando querem uma coisa devem lutar por ela."
Rhune Matthiesen e a mulher, portuguesa, decidiram vir viver para o Porto. " A maioria dos portugueses são pobres ou muito pobres. Recebem salários muito baixos, o salário mínimo é quase nada. Mas depois há outros que recebem muito, muito dinheiro, que têm muitas casas e vários carros. Na Dinamarca não há uma diferença tão grande entre o ordenado de uma empregada de limpeza ou de um mecânico e o de um professor ou médico, e isso choca-me.[...] Em Copenhaga, a praça da universidade está cheia de bicicletas, no Porto as pessoas circulam de carro. Até os estudantes vêm para as aulas no seu próprio carro. Não percebo.[...] A maior parte das pessoas passa muito tempo no local de trabalho mas tem uma atitude muito relaxada. Fazem muitas pausas para o café, demoram muito tempo a almoçar e a conversar com os colegas. Em geral penso que a produtividade é fraca porque o esforço também é pouco.[...] A informação não é clara, há muita corrupção, os políticos não gastam bem o dinheiro público. Mas os portugueses toleram, são passivos. São capazes de se zangar numa fila de trânsito mas não agem contra a corrupção. Isto eu não compreendo"
Richard Zimler, americano. Vive em Portugal à vinte anos e já tem nacionalidade portuguesa. " Os portugueses não têm dinamismo. Ficam paralisados, à espera que os problemas desapareçam. Às vezes apetece abaná-los e dizer-lhe: mexam-se, façam alguma coisa pela vossa vida e pelo vosso país.[...] Os portugueses até trabalham muitas horas, mas são pouco eficientes"
Pascal Chesnot, francês. Montou um restaurante de cozinha francesa em Lisboa. Trabalha com pessoas de diferentes nacionalidades. " Portugal viveu sempre em crise. Agora há mais desemprego e as pessoas sentem maior frustração, mas continuam resignadas. É o fatalismo do país. Pode ser difícil de compreender para um estrangeiro.[...]. Já tive uma cozinheira portuguesa mas não resultou. Queria folgar ao sábado, ao domingo e feriados, indiferente à especificidade deste projecto"
Kristina Joahnsson, sueca, directora-geral do Ikea em Portugal. " É importante que as organizações ofereçam condições para as pessoas se desenvolverem.[...] É preciso ter vontade de mudar e para isso tem de se apostar nas pessoas, são elas que fazem a diferença na vida das organizações e do país.[...] O sol, o bom tempo e o mar são fantásticos, mas só por si não bastam"
Extraído de Notícias Sábado de 28 de Maio de 2011