quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Jesus, Salomão, o Tempo e o meu avô José.

É importante ter conhecimento. A luta pela supremacia na sua aquisição insere-se hoje nos programas e objectivos de todos os quadrantes da actividade humana. Mas o conhecimento, em si, não pode deixar reféns de matrizes ou ideias feitas aqueles que o procuram e desejam. Seria aliás uma incompatibilidade formal se tal se verificasse. Conhecimento é passaporte para além do imediatismo, sendo que este último reduz o ser humano à escuridão da caverna e à redundância da vida que se pretende encerrar no utilitarismo dos ciclos temporais da humanidade de todos o séculos. Acho que era isso que Jesus queria dizer ás multidões no Evangelho de Lucas :
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“Hipócritas, sabeis discernir a face da terra e do céu; como não sabeis, então, discernir este tempo ?”.
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O sábio Salomão disse saber que há um tempo e um propósito para tudo debaixo do céu. Não sei se o meu avô José saberia dizer quem foi Salomão. Provavelmente sim; quanto mais não fosse pelo conhecimento que tinha da avisada sentença que o rei proclamou sobre a pertença da criança disputada por duas mulheres, relatada pelo Livro Sagrado. Mas há uma coisa que eu tenho a certeza que ele sabia: dar, e receber crédito do tempo e “adivinhar-lhe” os contornos pelos sinais que este lhe transmitia.
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Hoje fala-se genericamente de crédito financeiro, crédito hipotecário. Economia de casino, dinheiro virtual sem correspondência prática a nenhum outro valor tangível. O tempo, não é um valor virtual nem intangível. Apesar de o sentirmos e de assistirmos à sua passagem, não podemos fazer nada para contrariar a sua marcha. Aprisionamo-lo em caixas de relógios e ele liberta-se de imediato em circulares movimentos de sentido único. Não gosta de cadeias, o tempo. Mais do que muitas vezes o consideramos nosso inimigo; ele continua a provar-nos o contrário e estabelece connosco uma troca justa: pede-nos e dá-nos crédito, e ensina-nos a discernir o saldo que resulta das colunas "deve" e "haver". Aprender a ler os tempos e o que eles nos dizem, dia a dia, era o conselho do Mestre para o povo, naquele momento. Sem isso, sem esse conhecimento, seremos pouco menos que analfabetos, por muito que seja o nosso conhecimento.
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Jacinto Lourenço